quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Nem todo texto tem título



Todo mundo tem um pouco do carnaval. Mesmo quem não gosta, acaba cedendo ao feriado para reavaliar e contribuir de um jeito ou de outro para a tese de que para brasileiro, o ano só começa depois da folia. E há quem custe a acreditar que o feriado é motivo cristão para dar adeus à carne. Esta última é a que me chama a atenção, mas mesmo assim nada me tira da cabeça que o carnaval é o grande divisor de águas da vida civil do brasileiro.
Talvez seja mais objeto de análise antropológica do que crendice cultural, mas é fato entender que cada um tem seu carnaval dentro de si, que brota da explosão das atitudes, da ilimitação da criatividade. Do eterno pique para o próximo dia. Todo mundo faz em algum momento apenas aquilo que tem vontade. Quem tem vontade de dormir, dorme. Quem bebe até encher a cara, faz com o maior prazer e sem medo da represália da ressaca do dia seguinte. As mulheres perdem o pudor virtual que sustentam o ano inteiro e acompanham os homens na orgia, sem medo do rótulo dos fiéis chatos que insistem em acreditar em amor recíproco ou até mesmo no casamento. Namoro? Palavra proibida nestes 5 dias. E ai de quem trazer o namorado para a viagem dos solteiros, vai ouvir os motivos de inveja ou simplesmente pedir para sair sustentando a justificativa num belo argumento de que "prefirimos algo mais tranquilo". No mais, as danças se revigoram a cada minuto, num movimento que mais parece uma constante competição de quem libera mais endorfina por segundo e produz risadas e comoção alheia do rídiculo por aquela dancinha que você julgou tão performática naquele momento de embriaguez. No entanto, todo mundo se diverte.

Mas depois, como uma reação à sensação de dever cumprido e do pensamento de que a partir de agora, a folia acabou e a vida de verdade TEM que começar, queira o carnaval ou não, cada um recomeça do seu começo. E o recomeço normalmente não se assemelha em nada com aqueles momentos de êxtase permamente característico do carnaval. Como em um grande movimento do desapego, todos se reúnem em volta da trivialidade novamente, de volta à velha vida já conhecida.
Finais e começos têm a mesma matriz: servem ora para conhecer o novo, ora para conhecer outro novo deixando o velho para trás. A quarta-feira de cinzas denuncia: é momento de deixar para trás a ressaca. E há ainda quem diga que dentro de si não mora um eterno carnaval.

Nenhum comentário:

Postar um comentário