sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Job Rotation com Adorno e cia.


Algum tempo atrás, li uma reportagem sobre as atividades mais lucrativas do mercado. Levei um susto ao saber que um jornalista de carreira em uma empresa de comunicação conhecida poderia ganhar até R$ 300.000,00 por mês. O meu susto não foi pelo valor em si, até mesmo porque esses jogadores de futebol de hoje em dia ganham milhões por mês. A diferença é que os jogadores movimentam o mercado, e o salário acaba sendo uma imposição virtual do próprio mercado sobre os lucros que eles geram. Propagandas, marketing, royalties, compras e vendas são algumas das razões que me fazem a aceitar estes valores. Nenhum jogador vale de fato o salário que ganha, é só perguntar para um fanático em futebol que tenha dinheiro se estaria disposto a comprá-lo para colocar na mesa de centro da sua casa ou de desfilar em alguma avenida de Paris. Diferente da arte, a lei do mercado é muito mais dinâmica. Tá, mas um jornalista? Não pela posição nem pelo mérito, que me perdoem os jornalistas. Mas é que me custa entender o porquê da influência de um ser humano sobre tantos outros. Outra vez ouvi: “bem vindo ao mundo corporativo”. Mas que mundo é esse? Ainda me dói, e confesso que estou em fase de adaptação neste "mundo", em saber que o reconhecimento de uma pessoa está na influência que ela exerce sobre as outras e não exatamente pelo que ela desenvolve no trabalho dela. Um desses sensacionalistas da vida aí, do tipo Arnaldo Jabor , deve receber rios de dinheiro por mês simplesmente para dar sua opinião tendo certeza que a influência que ela exercerá em tantas outras pessoas no meio social é o que pagará seu salário no final do mês. Nada contra Arnaldo Jabor, e tampouco que isso não seja uma coisa válida. Mas voltando ao que estava falando, fiz uma analogia do caso dele com o mundo chamado corporativo e mais uma vez confesso que doeu. Afinal, a competitividade hoje gira exatamente em torno disso, em ser influência para os outros. E o pior é que as pessoas se curvam e pagam pela presença dos gurus em suas vidas, apenas para que dizer que fazer e o que não fazer, como se vestir e se comportar diante de uma reunião importante. Mas será que esta influência é importante? Será que saber apenas citar Pareto ou Schopenhauer é realmente necessário para a composição do "briefcase" da empresa? Eu sim sou da opinião que ao citá-los temos que já ir pedindo desculpas e ajoelhar no milho para pedir perdão.
Bom, se doeu em mim, imagino como seria em Adorno. Aquela laguidibá de dialética negativa que ele escreveu no século passado com toda a certeza não passaria nos testes vocacionais das grandes multinacionais. Rio sozinho em imaginar como seria Dostoievski ao comparecer em uma entrevista, e ter que mentir que seu maior defeito é a sinceridade: hahaha.
Com certeza ele seria outro que amargaria a resposta de que “você tem ótimas aptidões, mas a empresa procura outro perfil mais voltado para a competitividade do mercado corporativo”. Blasfêmia.
Por fim, é importante que não percamos o foco: cuidado com as palavras, e mais cuidado ainda com os gestos. Sua mania crônica de roer as unhas, explicada cientificamente pela associação genética do adulto ao se relacionar com seu alter-ego criança, será avaliada por horas a fio pelos profissionais que se especializaram em psicologia corporativa e hoje são bem-sucedidos gerentes de RH, para que no fim concluam que você na verdade, apresenta sinais de nervosismo e até mesmo TOC de roer unha e, que infelizmente não se encaixa naquele cargo tão disputado. Ah, sem dúvida já vivemos no mundo de George Orwell ,de 1984: nos filmam o dia inteiro, pelas nossas ações e pela nossa inércia. Julgam e nos separam com o mesmo critério que o pessoal lá da CEASA separa os tomates podres dos bons. Grande coisa. E você, também quer dar uma espiadinha?

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Jack Eden?


Não fosse o toque sensível e pragmático do personagem, Martin Eden seria apenas mais um jovem que viveu a rodar o mundo através das viagens de baleeiros. Acabou por conhecer mais lugares que a própria condição financeira o permitiria. Em uma de suas andanças se apaixonou, conhecendo verdadeiramente o sentido do amor. Nos pormenores do sofrimento, descobriu que seu amor só poderia ser correspondido a partir do momento que se encaixasse no molde social e intelectual da amada, que o exigira evoluir como ser através dos estudos, do conhecimento e dos livros. Decidiu lutar por ela; estudou a fundo a estrutura do pensamento burguês da sociedade Americana do século XIX, e como isso fosse resolver seu problema, acabou por encontrar outro maior ainda. Ao passo que estudava, percebia que era mais ignorante do que antes.
Romance que retrata uma semi auto-biografia de Jack London, Martin Eden é um mini alter-ego do escritor que foi revolucionário do pensamento de sua época e reconhecido, como todo grande artista, apenas um século depois. As dúvidas que permeiam as questões de London são as mesmas discutidas em Martin Eden, e o romance serve como um espelho da sua própria história , reconhecidamente fracassada diante da sociedade que se vivia. Ambos utilizam-se do tempo de vida como forma de questionamento, aparentemente irresignado eternamente, porém sempre com belos ensaios daquilo que se “parece mas não é” e da eterna busca pela verdade das coisas. Martin Eden "auto-constrói” seu retrato no mesmo ritmo que segue sua linearidade pessoal: descobre primeiro a trivialidade, através do pensamento comumitário. Depois, descobre que aquilo é apenas uma parte do que se diz ser verdade e, por fim , porém previsivelmente, de forma trágica conclui que tudo o que se diz é mentira e que a única verdade reside no amor incondicional. Ao passo que estuda o academicismo, a filosofia, a economia e a psicologia , entende a lógica que sustenta o sistema capitalista universal, tecendo seu próprio caminho alternativo de pensamento à lógica imposta pelas pessoas que vivem nele.
No entanto, não acredito que o mais prazeroso esteja nos ensaios sobre a divisão do trabalho social, da máquina capitalista, ou da relação entre força produtiva e intelectual e da forma como elas impactuam no desenvolvimento humano dos indivíduos- tampouco sobre o socialismo da época. O grande mistério de Martin Eden está no seu diálogo invisível com Nietzsche acerca das questões realmente relevantes para o homem atingir sua felicidade e de sua revanche pessoal com os preceitos da psicologia humana. Ao entender a lógica social entende por si só o seu inconformismo em satisfazer aos padrões sociais em prol da etiqueta de “cidadão-comum”. A sociedade o exigia isso; queriam que fosse uma pessoa comum e que seguisse a cronologia virtual das coisas: estudar para trabalhar; trabalhar para casar e casar para ser feliz. No entanto, descobre que a sociedade que o exigia isso, era na verdade, escrava do conhecimento que ela mesmo pregava e que aquilo que acreditavam saber, na realidade era apenas produto da opressão burguesa em limitá-los a seres eternamente situados na mesóclise da ignorância e da sabedoria. Estudavam em demasiado para seguir a mesma cronologia, e o resultado disso seria o eterno circulo vicioso, que impossibilitaria aos seres de pensar de forma independente e autêntica.

Ao descobrir o verdadeiro amor, acaba por descobrir também que este esteve condicionado ao seu sucesso como ser social daquela sociedade, tendo uma vida trivial dentro dos moldes exigidos pela época.
O clímax do romance acontece durante o mergulho interno que Eden faz no período que desenvolve sua habilidade para filosofar em forma de poesia. Descobre sua capacidade de enxergar além do que os livros lhe diziam e principalmente de constatar os vícios que corroem o ser humano puro que vive numa sociedade podre. Ao mesmo tempo que era reconhecido como escritor, seu amor se esvaiu pela amada e ela retornou depois de concluir que ele já se encaixava como futuro esposo, devido à sua posição social e seu status financeiro. Se fosse transcrever em aforismos o sentimento de Eden, poderia dizer que pensara principalmente nas questões torpes da consciência humana, e principalmente em que o amor que sentia por ela não mudou depois que enriquecera, diferentemente dela. Ela o abandonara quando decidira continuar com seu propósito, independentemente do dinheiro. Quando retorna arrependida, a parábola que se constrói no monólogo é da dúvida sobre sua própria mudança: tivera em algum momento o amor sentido por ela mudado por causa do dinheiro? Mas ele continuava exatamente o mesmo, antes e depois do sucesso.

Acredita na incondicionalidade do amor como única forma de evolução e revolução. Os seres são egoístas e alienados, porém quando descobrem o poder de isenção dos valores externos, alcançam a sua a real intenção da existência:

Do que seria da tua beleza, se eu fechasse os meus olhos para você?
Do que adiantaria essa tua ideologia, se tua própria liberdade se transformasse em opressão?
E se eu pudesse ao menos te mostrar, que o inferno são os outros?


Não acredito que a intenção de Jack London fosse demonstrar uma das faces niilistas do seu personagem, que mergulha num lago profundo de rocha sem saber que lá não existe água, para depois chorar a desgraça humana. A construção que ocorre no decorrer do romance é exatamente a representação de uma das fases da vida de todo indivíduo , que livres , conseguem optar sem ressentir, ou não. Eminentemente presente, a questão do dúbio social e do niilismo como forma de execração e repúdio à forma imposta por um materialismo histórico inútil, que aprisiona ao invés de libertar, é atenuada por Martin Eden, que descobre sua vocação para o monismo: se considera um legítimo monista, pois procura aquilo que de fato lhe faz feliz, com a liberdade do conhecimento e pautado no livre-arbítrio do querer. O final do romance acaba sendo mero detalhe, pois a intenção da mensagem já fora passada muitas páginas antes.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Mas que preguiça de acordar

E quando você vê, já foi.
Já são onze horas, já é ano que vem.
Já foi aquilo que se achava que iria ser.
Já foi a ilusão, a ideologia, o idealismo. Já foi a perfeição.
Já foi a ideia de que o mundo gira.
Chegou a ideia de que o mundo gira. E a gente gira junto com ele.
Esperou quem tinha esperança, agiu quem teve liberdade.
E quando você vê, já foi. Aquela ideia que empolgava, mudou.
Sem sentir, ficou prisioneiro no sonho. E quando acordou, viu que tudo mudou.
Aturdido, questiona: - será que eu mudei também?
Sim, quando sonhava, mesmo sem sentir você vivia.
E que por viver, as escolhas não se escolheram sozinhas. Alguém fez por elas.Você fez por elas.
E quando você vê, já é. Alegria, em ver que o sonho mesmo não realizado ainda te fez suspirar.
E quando você acordou, pronto, o mundo ainda girava.
Mas tudo continuava a mesma coisa. Mas de alguma forma, diferente.
"Você mudou. Você saiu e entrou de volta"- ecoou o grito do presente.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Destino ou livre-arbítrio?



Um dos grandes mistérios que acompanham o ser humano desde o seu reconhecimento é o impasse livre- arbítrio x determinismo. Pode o ser humano escolher sua própria sorte, ou deve estar ele condicionado às forças externas, terrenas ou extra-terrenas para ser feliz?
Entendo que este assunto rende uma bom apanhando de todas as matérias cognitivas e humanísticas: a psicologia, filosofia, cosmologia, antroposofia, física, biologia, matemática, tem, inevitavelmente uma suposta resposta para esta pergunta, tanto é que já conseguiram formular brilhantes teorias que vão desde a teoria da causalidade à chamada "coincidência significativa", de Jung.
É impossível debater sem antes conhecer parte destas teorias, pois elas têm muito o que nos ofertar, e acredito que o caminho real para elucidar esta questão é simplesmente entender, no final das contas, a estrutura que rege o universo.
Sentimos no íntimo esta sensação de que é possível compreender além do que nossa percepção atual, de que realmente existe algo maior do que a própria realidade. Quantas pessoas não tiveram experiências sensoriais que simplesmente ignoraram as leis materiais de tempo, espaço, matéria, corpo e mente? Foram estas experiências reais, ou simplesmente uma reprodução virtual do que poderia acontecer? O tempo que transcorreu, existiu, ou ele de certa forma não pode ser contabilizado quando trata-se de um momento mágico que envolva o puro espírito? Afinal, o tempo existe?
Em primeiro lugar, precisamos frisar que nossos conceitos trivias são mentais, ou seja, criados pela percepção humana, e não espiritual. O conceito de determinismo diz que o universo conspira ao seu favor para realizar aquilo que esteja planejado para você. Entendo que as leis herméticas que falam sobre determinismo não conseguiram explicar na essência o que isso significa dizer, e por esta razão, brigamos eternamente, desde o início dos tempos, sobre a nossa liberdade de modificar um eventual destino. A era Iluminista destacou isto com ênfase: " Não há ser humano que possa sucumbir à uma boa escolha em detrimento de outra de outrem". Ou seja, a educação humanística prevê isto: se queremos ser felizes, devemos escolher entre uma coisa e outra, sempre.
Acredito que ambas visões estão certas e erradas ao mesmo tempo; somos únicos no universo, e o espírito nos mostra isto. Ou seja, de início, o universo através da troca de energia nos prevê algo muito bom, sempre. Basta agir para isto. As teorias mais clássicas desde o princípio souberam disto:
"Não adianta se querer algo diferente , se a posição se mantém igual à anterior"
Stephen Hawkings,
O universo pulsa constantemente. Pulsamos junto com ele, com a matéria e energia que envolve todo o cosmos, e precisamos saber disto através da consciência. A partir do momento que entendermos que somos exatamente aquilo que procuramos nas outras coisas, conseguiremos compreender que Deus está em nós, e só nós. Somos o puro espírito, e se pulsarmos junto com ele, o universo nos dará apenas aquilo que ele tem de melhor: o puro Vazio.
Determinismo e livre arbítrio foram banalizados pelo racionalismo humano: tentamos entender se temos escolha, enquanto somos a própria escolha. Tentamos entender se o tempo faz sentido, enquanto somos a eternidade.
Basta saber, que as teorias do "contra-tempo" têm se fortalecido neste último século exatamente por este motivo: as pessoas que têm pensado neste sentido compreenderam que o tempo é algo vazio, que se esvai no nosso conceito de civilização. Ou seja, seguimos a cronologia virtual das coisas pois acreditamos que ele nos substituirá pelo projeto da imortalidade. Puro conceito social.
Acredito que temos uma missão para compreensão: entender que estamos determinados sempre ao puro espírito, mas devemos nos posicionar para o universo nos encontrar. Nada é estável, tudo é mutante. Precisamos adquirir a consciência de que temos todo o potencial para evoluir, mas precisamos querer: isto se confundiu com livre-arbítrio. Este, é ao meu ver, o real livre arbítrio: querer.
Auto conhecimento é algo genial:




Cada um, que terá a liberdade de escolher qual verdade acreditará a partir de determinado momento decisivo. O desenvolvimento interno se funda no fato de cada qual buscar a sua própria sorte, com base em princípios que seguem a lógica universal do conhecimento; o desprendimento se inicia no momento que o indivíduo reconhece o seu potencial de escolha e aliado ao livre-arbítrio, busca no auto-conhecimento a sorte correta para escolher. Ao passo que cada qual desenvolve tal habilidade e reconhece o poder da ação humana sob o universo que está envolto a cada um , compreende-se concomitantemente que a evolução da liberdade está condicionada a cada qual seguir o seu propósito de vida, ou seja, existe uma condicionante, porém diferente da acepção de destino pré-determinado, em que toda a ação pautada na liberdade de escolha e no conhecimento do livre-arbítrio representará exatamente aquele propósito universal e ao mesmo tempo pessoal, em que as atitudes livres comandam o fluxo do universo ao ponto de cada qual atingir sua órbita interna de evolução. A existência da ideia de destino no entanto é subsidiária, e acompanha a crença em algo superior, não necessariamente teológica, mas que exclui de forma parcial o livre-arbítrio. A mensagem que o universo nos passa constantemente é que somos responsáveis pelo nosso propósito, porém mesmo a condição de “ dever ser” ou de predestinação , se fundamentadas com a liberdade de escolha e com o livre-arbítrio poderão ser perfeitamente aceitáveis. O paradigma está exatamente no reconhecimento e no auto-conhecimento destas regras universais; em primeiro lugar, conhecê-las para reconhecê-las como existentes; em segundo, aprendê-las, com base no auto-conhecimento, no desapego aos padrões impostos de pensamento e na crença em conceitos duradouros e herméticos, como a intuição e a intenção.
O ser humano é único no universo, o que não significa dizer que está sozinho. Cada indivíduo detém a incrível possibilidade de construir aquilo que quiser para si; a isto chama-se liberdade. E cada indivíduo detém a incrível capacidade de escolher aquilo que é melhor para si mesmo; a isto chama-se livre-arbítrio. Estas são verdades complementares e que jamais poderão andar separadas.
O conceito de destino que se transmutou na nossa civilização é óbvio: acreditamos na predestinação e no determinismo, mas agimos sob inércia.
A subsidiariedade da crença é algo presente em nós e produto da condição do indivíduo ser um ser social, no entanto a sabedoria reside em abdicar-se da crença em verdades terrenas em substituição à verdade universal do movimento cíclico das coisas, como forma de abandono da velha ideia de destino passível da inércia frente à concepção de predestinação. A evolução que o universo nos cobra está exatamente no desapego das coisas velhas, dos conceitos retrógrados e que aprisionam o ser às verdades alheias e que os distanciam da sua própria capacidade de agir em concordância com o universo.
A energia da mudança no entanto é sempre pulsante; a inatividade não gera movimento nem ação , tampouco reação.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Resolução da semana

Crescer reside no aprender
Consiste em admitir que somos parte da nossa própria evolução
Que nascemos não para subir mais alto, mas para andar mais para frente sempre
Entender que temos o espaço de uma vida inteira para evoluir
Que somos parte do universo e que a energia ao nosso redor faz parte de nós mesmos
Que o paraíso tem morada em cada indivíduo
Buscando dentro de nós o entendimento para compreender os momentos corretos para agir
Que cada um é o seu reflexo na natureza que nos envolve
Buscar o amor como uma maneira de se aproximar de Deus, qual seja o seu
Lembrando que amar faz bem principalmente a quem amar
Significa viver com singularidade, cada qual buscando a sua verdade com liberdade e livre arbítrio
Procurando sempre aquilo que de fato se precisa ter
Entendendo o tempo como instrumento para essa compassada evolução
E que por mais que se procure, só ele poderá nos encontrar
Envidando o esforço para se conhecer , para que se aprenda a primeiro amar a si próprio para depois a outrem
E que no fim, aprendemos apenas para crescer
Para entender que o final não é final, e sim o começo para a eterna eternidade

Sobre ser tupiniquim


Para inaugurar apenas:

O brasileiro se orgulha da sua diversidade cultural, das belezas naturais , da maneira como fala e como leva a vida. De fato algo impressionante em um lugar aonde as proporções continentais ao invés de afastar, aproximam de maneira intensa a maneira de se pensar, tornando o pensamento brasileiro uníssono e sincretista. Fala-se muito em pluralidade cultural, mas no âmago da questão , o brasileiro tem dentro de si a bússola racional muito similar que o orienta às coisas que ocorrem mutuamente em seu círculo social. Em tratando-se de razão, costumeiramente o brasileiro não consegue atacar o seu próprio ponto fraco, forjando às maneiras estrangeiras e modos de pensamento ancestrais dos nossos próprios colonizadores. Temos grande dificuldade em reinventar nosso presente, e nosso passado é constantemente aludido às replicas de pensamento das escolas mais tradicionais. Tome-se por exemplo a filosofia: no Brasil ainda tem-se a ideia de que Filosofia é ciência de se pensar e refletir, mencionada pomposamente os clássicos gregos e romanos como maneira de determinar a maneira de se viver e pensar. Nossos filósofos se aponderam dos pensamentos antigos para justificar a estrutura completamente egoísta existente nas nossas relações sociais e patrimoniais; chega-se a contradição de ter-se de admitir que a filosofia brasileira é feita no intervalo das discussões entre Congresso e Judiciário, haja visto que vivemos em um tempo de grande reflexão da legitimidade dos atos do primeiro, que são respaldados ou não pelo segundo. Independente da ressalva, trata-se da manifestação de alguns traços básicos de nosso caráter intelectual e de nossa condição política ; argumento irrefutável à parte, isso faz parte da nossa história sim , porém se nada fizermos, corremos o risco de continuar a ser apenas um país jovem que não sabe a que veio, nem o que tem a dizer, por medo, omissão ou covardia e, caso jamais inventemos nossa posição, nada viremos a ser, sem termos racionalizado sobre nossa exclusiva problemática nacional.
É repetitivo ainda falar das benesses do patrimonialismo brasileiro quando a própria definição não permite auto-definições, principalmente por se parecer tão impregnada nas nossas vidas e ao mesmo tempo dotada de tal flexibilidade de manifestação , que nem mesmo o menos lascivo dos seres pudesse prever até onde vai a abrangência desse câncer. Sob o aspecto histórico, uma justificativa plausível é entender que até onde se sabe, o direito contemporâneo é fruto de uma troca prevista no contrato-social, mas que acima de tudo , previu que para o estado de bem estar social se efetivar, os cidadãos, que são eu e você, deveriam abdicar de uma patologia crônica nas civilizações deixadas no passado: o egoísmo social. Não trata-se de discutir o direito material, da estrutura judiciária e do garantismo jurisdicional, pois estes já existem como a própria ontologia da questão denuncia: fala-se do direito de Voltaire, daquele que diz que o direito de cada um é lutar para que o do outro coexista. Significa mais ou menos dizer que , apesar do Senado ser corrompido, isso não me dá o direto de o ser , mesmo quando o Estado não cumpre com o seu papel existencial. O grande problema é que nós, brasileiros, ainda não conseguimos elucidar essa questão dentro de nossas filosofias: cobramos em demasiado das coisas formais e nos despreocupamos com as informais. Isso significa dizer que o altruísmo que deveria estar presente, ainda não chegou. Mesmo assim, o jeito brasileiro de resolver os conflitos ainda é inerente da nossa característica cultural, e é isso que nos faz brasileiros e nos enche de orgulho mundo afora. O jeito brasileiro é o que corrói o espírito social e o que nos afasta da civilização.
O milionário que chega no saguão do aeroporto e se depara com uma fila enorme burla o improvável e tenta de qualquer maneira se antecipar; o impaciente no supermercado fura a fila alegando motivos que mascaradamente justifiquem a sua pressa; o jovem que extrapolou a velocidade permitida suborna a autoridade para se livrar – são situações prosaicas que ocorrem diante dos nossos olhos diariamente, passam sem notabilidade e quando criticados, invertem o pólo da responsabilidade do inquisidor , alegando os interlocutores, caretice ou síndrome de querer- fazer- sempre-o-bem. Pois bem, vive-se em um lugar onde espantosamente a dicotomia mais contraditória é ação afirmativa travestida de autodefesa: pratica-se o errado julgando-se o certo e, critica-se o certo alegando o errado. Esse comportamento, diagnosticado como uma patologia social, é na verdade motivo de identidade dos compatriotas; gabam-se da maneira leve e despreocupada de viver, desprezando as premissas do bom convívio para a manutenção da paz social. Tais atitudes são ainda mais amiúde protegidas pelo argumento de que o brasileiro é um povo que sofre, mas que nunca desiste, o que contribuí para que a propaganda interna no ego dos brasileiros cresça e aumente a audiência daqueles que os assistem. A corrupção tão combatida não é proveniente de seres à parte da nossa realidade- eles não nasceram em lugar diverso do nosso, não conviveram com pessoas diversas de nós, não foram governadas por governos diversos dos nossos, o que significa dizer que em regra, um pouco do que a nossa ética se queixa, é aquilo que nós representamos na vida real, sem perceber que somos parte desta realidade que ajudamos a criar diariamente e, inconscientemente sem saber que “eles” na verdade, somos nós.